Uma breve história do 3D Studio MAX na minha vida (com um plot twist no final)

Já devo ter mencionado anteriormente que conheço o 3D Studio (ainda antes de ser MAX) desde os meus 18 anos – para referência, na data de publicação deste post, eu conto 41 primaveras – e trabalho nele a pelo menos 10 anos.

Me lembro de ter lido sobre o 3D Studio em uma revista chamada CD-Rom Today (quase certeza de que era essa). Na matéria tinha até um tutorial para modelar olhos “incrivelmente realistas”.

Eu já estava aficionado por 3D e sonhava com a produção do meu próprio Toy Story, então, nem preciso dizer que eu PRECISAVA desse programa.

Encontrar o software foi uma tarefa hercúlea. Não vendiam programas por baciada na feira. Bom, vendiam sim, mas o 3D Studio era algo completamente novo. Claro, eu poderia ter comprado o software oficialmente mas… bem… Eu era só um garoto desempregado de classe média-baixa sem acesso a cartão de crédito internacional. Poderia até vender um rim, mas os dois já eram meio zoados na época.

Enfim, demorou em torno de um ano até o amigo de um amigo aparecer com o 3D Studio R4 completinho, incluindo bibliotecas de materiais e texturas. Um achado, abraço de mãe. Só precisei de uns nove disquetes de 3/4 (pergunte ao seu pai) e uma cervejinha para ter em minhas mãos o software que mudou a minha vida.

Eu devo adimitir, o 3D Studio não era exatamente uma boa porta de entrada para o mundo da modelagem e animação 3D. À primeira vista, sua interface parecia um grande amontoado de botões, janelas e menus.

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Interface do 3D Studio R4

Na época não havia muitas outras opções, pelo menos para mim. O Blender e o Maya só seriam lançados em 98. Tinha também o Pov-Ray, que consistia basicamente em “programar” linha por linha a cena em 3D. Delícia, né? Pois é.

Foi um início difícil. Por algum motivo, eu só sabia fazer olhos… Tutorial na internet? Sorry baby. Youtube? What a hell is this? O negócio foi meter a cara e ir fuçando.

Passava as noites testando cada ferramenta, experimentando cada comando do programa. Levou um tempo até eu aprender que a cena precisava de luz para ser renderizada. Mais um tempo para entender que a textura precisava ser mapeada no modelo para não parecer um rascunho do Basquiat.

Com o tempo, eu já me sentia em casa com o software. Sabia onde estavam todas as ferramentas, entendia todos os conceitos básicos e até já me arriscava com animação:

* Foi mal a resolução ruim. Eram as (minhas) limitações técnicas da época.

O tempo foi passando e a brincadeira foi ficando séria. Com o lançamento do 3D Studio MAX para Windows muita coisa mudou. A interface se tornou mais intuitiva e amigável, novas ferramentas foram adicionadas e, a cereja do bolo, agora era possível visualizar os modelos com shading nas viewports. Eu estava mais feliz que pinto no lixo.

Mas ainda não produzia nada. Na época eu também estava brincando com estudando o The Games Factory –  tentando criar o jogo da próxima geração – e acabei perdendo um pouco o foco.

O MAX e a modelagem ficaram congelados em carbonita por um tempo, até que eu fui trabalhar na Digerati em 2003, onde tive contato com o departamento de arte e… não espera. Na verdade, o departamento de arte se focava quase completamente em Photoshop, Illustrator e InDesign. Ninguém lá era modelador ou animador…

Mas tinha o departamento de Devs. Sim, lá tinha um pessoal muito interessado em modelagem. Foi com eles que eu consegui um DVD com uma quantidade absurda de tutoriais sobre modelagem e animação. Nem tudo era sobre o MAX. Alguns tutoriais abordavam o Maya (que ainda não era da Autodesk – na época era da Alias), focando principalmente em animação. Outros falavam sobre um software meio louco de escultura, um tal de ZBrush.

Com alguém para conversar sobre o assunto e trocar experiências, voltei a me dedicar ao mundo da modelagem e ao meu querido MAX. Fiquei tão empolgado que até criei um curso de introdução ao 3D Studio MAX, publicado pela própria Digerati.

Quando me desligaram da empresa, decidi que ia viver pelado no mato me arriscar como freelancer modelador e animador.

Tive muita sorte de conseguir um job para um treinamento. A ideia era usar um personagem digital animado como instrutor virtual. Claro, tudo era muito simples. Rodava em uma plataforma Flash, sem voiceover ou dublagem.

Nota: Era para ter uma imagem do personagem aqui, mas os arquivos se perderam na “grande arrebatamento da HD de backup de 2011”. Mas imagine uma minhoca azul com um grande olho na ponta. Era tipo isso.

Em 2008 os jobs começaram a ficar mais exigentes e logo eu precisaria de um reforço. Foi quando eu fiz um super intensivo de 3D Studio MAX na Cadritech. Foi um mês inteiro aprendendo coisas novas sobre modelagem, rig, animação e render.

Daí para frente, com mais confiança, comecei a produzir novas peças mensalmente, como esse instrutor virtual:

professor

-Olá pessoal! Eu sou o professor Eugênio, uma cópia safada do professor Dingledong do Pica-pau.

E essa menininha bizarra que parece um ET linda, usada em uma campanha interna para uma empresa de Brasília:

clarinha

-Eu sou a Clarinha! Leve-me ao seu líder.

Embora eu estivesse “vivendo o sonho” e muito envolvido com esses jobs, trabalhar em troca de “ganhar exposição” (quem é da área sabe) não estava fechando as contas no final do mês. Foi quando eu comecei a procurar emprego como modelador/animador 3D.

Fiz algumas entrevistas e testes em diversas empresas. A maioria era de empresas de jogos.

O teste mais promissor era o que eu fiz para a Gameloft – modelagem e animação de um tenista. O feedback foi bem positivo, mas eu ainda teria de aguardar uma resposta por parte da empresa.

Nesse meio tempo eu recebi a chamada de uma outra empresa que “meio que trabalhava” no ramo de games. Como o final do ano estava quase aí e a grana estava bem curta, resolvi aceitar o convite da empresa, pelo menos até receber a confirmação da Gameloft – no pior dos casos, ficaria uns três meses nessa empresa.

Então, no final de 2008, entrei na Interativa (que ainda não era Events, mas fazia jogos para eventos, convenções e treinamentos) como modelador/animador… e artista 2D, programador Flash, “programador” Quest 3D, manipulador de personagens virtuais, editor de vídeo, editor de áudio, QA, game design, artista técnico e, em algum momento, porteiro (alguém contesta? Não? Ok, vamos prosseguir).

Muitos cargos para três meses? Bom, nove anos então seriam o suficiente, porque a Gameloft nunca ligou.

Bem, durante essa vida de Buckaroo Banzai eu tive muito tempo para continuar estreitando os meus laços com o MAX. Havia uma necessidade contínua de produção de modelos 3D, desde personagens completos até modelos genéricos como mesas, cadeiras e aparelhos de ressonância magnética.

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Viu o que perdeu Gameloft?

Durante todo esse tempo, o MAX sempre atendeu às minhas necessidades como artista 3D, fosse modelagem, animação ou render. Mas não eram apenas flores no paraíso.

Com o avanço das versões, o software foi ficando mais e mais pesado. Com o tempo o meu computador da Nasa já não aguentava mais gerenciar o MAX. Os bugs tornaram-se uma constante e geralmente eram corrigidos na próxima versão (que era anual).

Por anos eu trabalhei com o MAX sem grandes problemas, mas nunca percebi suas limitações até meados desse ano, quando comecei a trabalhar em um projeto de avatares customizáveis para o Unity. Eu já tinha feito um projeto similar, embora mais simples, no final do ano passado usando o MAX e já havia enfrentado alguns problemas na criação do rigging.

Não sei se foi uma daqueles momentos insight, mas eu estava conversando sobre o projeto com meu colega e disse:

– Ei, e se eu usasse o Maya para fazer os personagens?

Eu só estava pensando na parte de skin e rig do personagem, mas daí ele falou:

– Sim, pode usar o Maya no projeto todo.

Seria o momento de eu dizer que ainda usaria o MAX para toda a parte de modelagem e UV do personagem. Seria sensato uma vez que eu só havia usado o Maya quando fiz um curso de animação e não conhecia muito do programa, em especial a parte de modelagem. Mas eu só disse:

– Ok.

Lembro de terminarmos a conversa, baixar e instalar o Maya, abrir a interface e ter uma sensação de confusão, seguida de uma leve melancolia.

Eu acabara de sair da minha zona de conforto. Sai da minha casinha quentinha e segura, onde eu morava à mais de 20 anos para pisar dentro de um bosque escuro e úmido.

Mas vejam só. Essa escuridão até que fez bem para os meus olhos e a umidade até melhorou meus problemas respiratórios. Depois de uma semana eu já andava sem medo por aquele bosque. Com um mês eu já conhecia a maioria das árvores.

Com mais um mês, eu já havia derrubado metade das árvores do bosque e construído uma cabana respeitável.

A verdade é que o Maya (o bosque era uma metáfora, tendeu?) é um software completamente diferente do MAX. Não melhor ou pior, mas diferente. Se o MAX é o “cara” das maquetes eletrônicas, Maya é o “cara” dos personagens 3D.

Não demorou muito para eu começar a me perguntar porque não havia mudado de software a mais tempo. A resposta era simples: zona de conforto é um inferno. Fiquei tanto tempo acomodado no mesmo software que nunca me perguntei se ele era a melhor ferramenta para o que eu fazia.

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Match 5, nosso mascote lá na Talent Matching Kludo. O render foi feito no Keyshot.

Não vou ser hipócrita: muito do que eu aprendi no MAX eu uso hoje no Maya. Foi a minha porta de entrada para esse mundo e minha segurança nos projetos difíceis. Não me arrependo de ter morado tanto tempo nessa casa. Mas eu acredito que a gente tem que procurar o melhor e, muitas vezes, isso significa deixar a nossa casa e não olhar para trás, trazendo consigo somente o que tirou de bom nessa estadia.

“Obrigado MAX, por essa jornada maravilhosa e por me estender a mão para iniciá-la.”

( ˘ ³˘)

Nota final: E… eu ainda não produzi o meu Toy Story. Mas está na lista…

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